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Roqueiro David Byrne comanda espetáculo sobre o cérebro humano

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Nós estamos em uma estrada rumo a lugar nenhum, entre aí.” O convite para uma (louca) carona que está nos versos de Road to Nowhere, um dos maiores sucessos da banda Talking Heads, se encaixa bem ao novo projeto do líder do grupo, David Byrne. Com uma carreira rica não só em criações na música mas também em quase todas as formas de arte, o norte-americano se lançou há pouco em mais um campo: o da neurociência.

Em parceria com a investidora Mala Gaonkar, Byrne montou um laboratório que não
tem nada de tradicional. Sua primeira apresentação ao público foi no Vale do Silício,
com a mostra The Institute Presents: Neurosociety, que ficou em cartaz de outubro
de 2016 a março deste ano.

O projeto maior, cujo nome é Theater of the Mind (Teatro da Mente, em português), está programado para os próximos meses. “Esperamos estreá-lo em Nova York ou Londres no próximo verão ou outono [do Hemisfério Norte]”, conta a produtora LeeAnn Rossi, que trabalha com Byrne.

Para chegar ao seu modelo ideal de laboratório, o norte-americano visitou centros de pesquisa em cidades como Londres, Paris, Barcelona, Estocolmo, Copenhague, Boston e Nova York. Fazendo essas visitas com olhos de curador, Byrne forneceu à ciência uma grande dose do que mais entende: arte.

Com uma hora de duração, Neurosociety é uma espécie de espetáculo científico — caprichado nos cenários, cheio de mistério e com muita participação do público. No repertório, uma seleção das pesquisas mais interessantes descobertas ao redor do mundo, espalhadas por três salas de uma galeria de arte. “Informação está disponível em todos os lugares, mas experiência é algo único e que tem um valor crescente em um mundo em digitalização”, explica Byrne no texto de apresentação do projeto.

É hora do show
Quando GALILEU esteve na Galeria Pace, em Menlo Park, cidade vizinha de San Francisco e da Universidade Stanford, na Califórnia, a expectativa de ser cobaia em experiências era justamente o que deixava o visitante da mostra mais ansioso.

As surpresas apareceram já na entrada. Todos os visitantes precisavam decidir se doariam anonimamente seus resultados para futuras pesquisas — pelo bem da ciência, a reportagem topou. Depois do cadastro, os próximos passos também intrigavam: bolsas e celulares foram retidos e todos tiveram de colocar sacos protetores de sapatos.

Com o grupo alinhado — até dez pessoas podiam entrar por vez —, não demorou para um casal de monitores aparecer com jalecos coloridos, no maior estilo Tíbio e Perônio, os cientistas gêmeos do Castelo Rá-Tim-Bum. A referência televisiva não estava tão errada: a primeira sala de experimentos parecia um cenário de um game show. Cada um dos visitantes ganhou um púlpito com um tablet para responder a perguntas em até três segundos apenas com “sim” ou “não”.

Parece fácil, mas o problema é decidir questões morais profundas nesse tempo. O que faz de você você mesmo? Você é você se perder os dedos? E se perder todo o corpo e for só uma talking head, uma cabeça falante (olha aí a citação à própria banda, Byrne)? E se comandasse uma missão militar, como Helen Mirren no filme Decisão de Risco, bombardearia um café com civis para matar terroristas? E se lá estivesse a Taylor Swift? E seu melhor amigo? Ao fim de cada bateria de perguntas, todas cheias de referências pop, os resultados no telão mostravam as tendências do grupo em comparação com os participantes prévios. Pobre Taylor: nosso grupo, como a maioria, não a poupou.

A sala seguinte provocava a pensar ainda mais rápido. Com todos acomodados em carteiras de uma típica sala de aula, o desafio era adivinhar resultados de uma eleição só de olhar por segundos para o rosto de candidatos projetados no telão, sem saber nomes nem partidos. A ou B venceu? As fotos, reais, de eleições norte-americanas para senador e governador em 2006, faziam cada um constatar o modelo-padrão a que nos acostumamos ver eleitos: homem branco, meia-idade e roupa formal, em detrimento de mulheres, negros, orientais. Só nos palpites, o grupo acertou 63%. No experimento original, da Universidade Princeton, o resultado foi ainda maior, de 70%.

O clima de realidade sombria ainda aumentaria. A terceira sala poderia facilmente estar na série Black Mirror — completamente branca, com grandes poltronas igualmente brancas e óculos de realidade aumentada. Porém, não estávamos sozinhos: uma pequena boneca no centro da sala também estava sentada em uma poltrona idêntica usando óculos idênticos. Lentes ajustadas nas nossas cabeças e nos vimos no corpo... da boneca, como em experimento já feito no Instituto Karolinska, na Suécia. A sensação de termos novas pernas só piorava por vermos o brinquedo sendo cutucado enquanto sentíamos umas batidinhas nos nossos próprios membros.

Os óculos saíram, ufa, e deixamos de ser enganados — será? A estrada desconhecida de Byrne parece, na verdade, levar mais longe. “Quando encaramos experiências fora do comum é que podemos ver e experimentar o que os nossos cérebros estão fazendo. O incomum revela o corriqueiro”, diz o artista.

MENTES BRILHANTES
Conheça a dupla por trás do espetáculo científico

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David Byrne
É um dos fundadores da banda de rock Talking Heads, como vocalista, guitarrista
e compositor. Na carreira solo, além da música, ele se dedica à literatura, às
artes visuais e ao cicloativismo.

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Mala Gaonkar
Formada em Administração em Harvard, dirige a empresa de investimentos
Lone Pine Capital, em Londres, com foco em tecnologia. Também mantém
projetos filantrópicos em ciência, educação e arte.

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